[09 de março de 2010]

Características do Engajamento em Jogos Sociais

redememe.jpgTentando discutir como e por que os usuários de sites de redes sociais engajam-se com determinados jogos, desenvolvi uma pesquisa a respeito. A idéia era comparar valores e interesses de usuários falantes da língua inglesa e portuguesa em jogos sociais (em sites de redes sociais, Orkut e Facebook). Vou comentar brevemente os resultados e as perspectivas construídas em cima da parte qualitativa da pesquisa neste post. O método utilizado foram duas surveys - uma em português e uma em inglês, aplicadas em novembro de 2009; mais uma série de entrevistas individuais. Já tinha falato desta pesquisa antes, mas agora estou focando os resultados finais.

Tipos de Engajamento

Uma das primeiras coisas que percebemos foi que existem dois tipos de engajamento: o social e o individual. Enquanto o engajamento social está relacionado com a rede social que apropria o jogo e as motivações de grupo, o engajamento individual está relacionado com as motivações pessoais de cada usuário. Assim, teríamos valores diferentes para um e para o outro.

  • Engajamento social: relacionado diretamente com as ferramentas de comunicação que o jogo possui. Observando os vários jogos, por exemplo, vimos que a competição para com os laços fortes (atores do primeiro grau na rede social, por exemplo) tem um poder maior de retenção e motivação imediata para jogar do que a competição para com indivíduos mais distantes na rede social (laços fracos). A competição para com esses últimos aparece com maior força depois que já há engajamento para com o jogo.
  • Engajamento individual: relacionado com os valores pessoais. Em geral: recompensas (o quanto o jogo recompensa o usuário e o quão valorizadas são essas recompensas por ele); usabilidade (quanto investimento é preciso para aprender a jogar x as recompensas que o jogo proporciona); identificação (o quanto o jogo "tem a ver" com a personalidade do jogador); e o lazer (o quão divertido é o jogo).


A pesquisa foi desenvolvida em cima desses dois tipos de valores. O objetivo era observar quais deles aparecem mais e se há diferenças entre os dois grupos. Inicialmente, foram selecionadas formas de expressar esses valores através das entrevistas. Depois, essas formas de expressão foram colocadas na survey e os respondentes foram solicitados a avaliar cada uma delas, de onde foi elencada a tabela abaixo com os elementos mais valorizados por cada grupo. Participaram cerca de 500 usuários de jogos.

Resultados



A partir da tabela acima, vemos uma primeira diferença interessante que é o fato de que os elementos sociais aparecem como mais valorizados para os falantes de língua inglesa, enquanto os elementos individuais aparecem mais valorizados para os falantes de língua portuguesa. Isso é provavelmente resultado do fato de que os jogos ainda são relativamente novos para os brasileiros (a maioria esmagadora dos respondentes), cuja principal apropriação desse tipo de site é para fins de construção da identidade (e não tanto para fins de interação, onde esses usuários preferem outras ferramentas como os mensageiros). Para esses usuários, o lazer, a diversão e a facilidade de uso são muito mais fundamentais. Já para os falantes de língua inglesa (americanos em sua maioria), já há um reconhecimento e uma popularização maior dos jogos, mais relacionados com valores sociais (fazem sentido na rede social). Para esses usuários, é fundamental que a rede social também jogue, embora o tipo de jogo - valor individual - apareça em primeiro lugar. Isso provavelmente dá-se por conta do fato de que esse tipo de jogo existe em maior profusão e variedade no Facebook, mais apropriado pelos respondentes que, deste modo, possuem uma experiência maior com eles.

Também podemos observar que o fato dos valores individuais aparecerem mais nos falantes de língua portuguesa pode ser um resultado da apropriação tardia dessas ferramentas no Brasil e, por conseguinte, sua apropriação estar mais relacionada com os usos mais tradicionais dos sites de rede social por aqui. A questão da usabilidade também é relevante, pois indica que os falantes da língua portuguesa estão muito menos dispostos a empregar tempo aprendendo como o jogo funciona. Isso também pode estar relacionado às dificuldades com a língua para aqueles que utilizam também o Facebook. Outro elemento interessante é a valorização da qualidade dos jogos (gráficos e roteiro) como engajantes. Assim, a mecânica do jogo e o seu desenvolvimento auxiliam, embora não determinem, o engajamento dos usuários.

Um último valor que pode ser salientado é a customização. Ela aparece como relevante para ambas as populações, o que indica um valor comum e uma apropriação comum: a da construção e expressão de identidade. No entanto, a customização também é relacionada com valores sociais, pois é uma identidade performática, construída para ser dividida com a rede social e que só faz sentido ali.

Essa comparação é interessante porque traz possivelmente o que seriam dois estágios da apropriação dos jogos em sites de redes sociais, um mais maduro - o dos falantes de língua inglesa, e um mais novo - o dos falantes de língua portuguesa. Essas diferenças, é claro, também podem ser culturais.
por raquel (08:29) [comentar este post]


Comentários

João Baptista Lago (março 15, 2010 4:04 AM) disse:

Raquel: vou fazer um comment a partir de minhas vivências no FB. Haveria nesses dois pólos engajamento social e engajamento individual, mas também algo intermediário entre ambos. No pólo social em seu sentido mais radical e puro possível, pessoas com um histórico relacional anterior ao game e ao próprio FB. O game neste caso seria um dos meios compartilhado pelos membros do grupo para se relacionarem entre si, assim: no Farmville você adota uma raríssima yellow cow e eu, teu amigo dos tempos de colégio, vou lá e comento que só vc mesma para adotar uma yellow cow, vide aquela saia amarela mutcho da riponga, que tavas usando no níver da Fulana, lembra? Um terceiro ser em comum entre nós dois, nosso dentista, deixa um outro comentário: que precisááááá de pacientes tão yellows como essa vaca, pois seus dentes devem ser amarelíssimos e ficaria rico fazendo clareamentos, "kkkkkkk". Em outras palavras, o game é um meio para esse grupo, mas não o fim. No outro extremo teríamos jogadores absolutamente desconhecidos (ou muito pouco conhecidos)entre si, para os quais o game seria um fim em si próprio e as relações com outros jogadores, absolutamente impessoais: "amigos" (rigorosamente entre aspas) adicionados com a finalidade única e exclusiva de usufruir melhor o game, ganhar mais gifts, passar a desfrutar de maiores privilégios etc. Neste caso, quanto maior a fissura pelo jogo enquanto fim em si próprio, mais frágil o vínculo estabelecido com pessoas que são adicionadas para jogar; talvez não se possa sequer falar de baixo capital social em comum entre essas pessoas porque esse capital social compartilhado sequer existiria, a não ser (como sugeri naquele artigo infame sobre o Plurk) enquanto algo fornecido pela... própria ferramenta, através do game (e neste caso teríamos de nos valer do que os americanos e não os franceses, escrevem sobre CS).

PS: acho os games do Orkut muito do pobrinhos, comparados aos do FB. Não tem como, em Colheita Feliz, construir cenários elaborados. Também não te oferecem a possibilidade de curtir coisas que psicanaliticamente situaríamos no campo das perversões, como comprar alguém e mandar esse alguém limpar a tua privada. Mas se são games pobrinhos e ao mesmo tempo fazem tanto sucesso, então seu uso seria, talvez, de natureza mais relacional (social), que qualquer outra coisa. Mas escrevo esse "Ps" no condicional e na base do "talvez", por ser não uma afirmação, porém uma dúvida. O que você acha (games Orkut x games FB)?

Janaina Jaroczinski (março 16, 2010 3:29 PM) disse:

Olá.

Estou cursando Comunicação Social - Publicidade e Propaganda na FURB (Blumenau/SC), e neste semestre estamos organizando uma revista, que já existe a 8 anos.
Uma das matérias dessa edição será sobre Redes Sociais, e gostaríamos de saber se não poderia colaborar nos ajudando com comentários sobre o assunto.

Obrigada a atenção,
Janaina

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