[26 de abril de 2009]

Espalhamento de Informações na Rede I : Jenkins e Eu

redememe.jpgHá algum tempo, o Henry Jenkins publicou uma série de textos no blog denominada "If it doesn't spread, it is dead", onde discutiu questões como memes, viralidade, espalhamento de informações e etc. Resumindo um pouco o que ele discutiu nesses posts, Jenkins discorda que possamos falar em memes ou vírus na mídia. Para o autor, essas idéias forçam a compreensão de que informações seriam simplesmente replicações de uma idéia original, o que seria muito diferente do processo de comunicação em rede, onde as idéias são repassadas, transformadas e modificadas. Principalmente, Jenkins não gosta da metáfora biológica por conta da involuntariedade da transmissão (típica do vírus). Para Jenkins, é preciso adotar um novo modelo de pensamento, que ele chama "Spreadable Media" ou Mídia "Espalhável".

The concept of "spreadability" preserves much of what was useful about the earlier models -- the idea that the movement of messages from person to person, from community to community, over time increases their effectiveness, and expands their impact.

Essa idéia do Jenkins é bastante interessante principalmente porque leva em conta o fato de que as pessoas têm intenções e motivações por trás das mensagens que são passadas adiante para suas redes sociais. Eu defendo a hipótese de que os atores sociais possuem motivações, e suas decisões a respeito de passar ou não informações para suas redes são baseadas, muitas vezes, em percepções de acúmulo de valor na rede (que eu chamo capital social). Apesar disso, nem sempre os atores tomam decisões racionais. Muitas vezes, vemos o comportamento de cascata, onde alguns atores decidem simplesmente baseados naquilo que outros fizeram, por imitação. Embora esse tipo de decisão possa ser racional sob muitos aspectos, nem sempre o é. Assim que não concordo totalmente com as críticas que o Jenkins faz à à metáfora dos memes (embora concorde quanto à viralidade). Claro, vamos lembrar que o meme não é viral, são duas metáforas diferentes (na visão do Dawkins, a metáfora do meme é genética e evolutiva, não viral. As idéias não se propagam por "infecção" ou contágio, mas porque, em última análise, são mais bem adaptadas -melhores - que outras). Dito isso, vamos passar ao ponto onde eu queria chegar.

Recentemente, o Jenkins fez um novo post, discutindo como essas características seriam observáveis no caso da Susan Boyle. Nesse post, ele afirma novamente:

Contrary to what you may have read, Susan Boyle didn't go "viral." She hasn't gained circulation through infection and contagion. The difference between "viral" and "spreadable" media has to do with the conscious agency of the consumers. In the viral model, nobody is in control. Things just go "viral." In the Spreadability model, things spread because people choose to spread them and we need to understand what motivates their decision and what facilitates the circulation.

Essa questão da consciência da propagação, ou seja, do fato de que as pessoas não republicam informações sem razão me levou a pensar mais nessa coisa das motivações pelas quais as pessoas republicam informações. Assim, juntei um conjunto de idéias a partir da minha pesquisa Difusão de Informações em Redes Sociais na Internet, que contou com o apoio do CNPq e que está no final, e vou fazer uma rápida sistematização.

Por que as pessoas repassam informações na Internet?

A primeira razão pelas quais as pessoas divulgam uma informação é por conta de seu valor. Esse valor percebido pode ter várias nuances: uma informação pode ser engraçada, relevante para a rede, acrescentar embasamento em um ponto que estou tentando defender, trazer uma novidade, etc. Esse valor é percebido com relação ao impacto que o ato de difundir a informação em uma determinada rede vai trazer. Há dois tipos de valores que são construídos na rede social: o primário e o secundário. Assim, se eu divulgo uma informação que considero engraçada, o primeiro impacto que espero é que as pessoas riam comigo (primário). O segundo impacto que espero é que as pessoas me considerem engraçada/legal/relevante por ter divulgado aquela piada engraçadíssima. Portanto, enquanto o primeiro impacto é sempre em relação à rede, o segundo é em relação ao ator.

Logo, a percepção da intencionalidade da mensagem passa pela percepção desses impactos, que podem ser traduzidos, em última análise como capital social, uma vez que tanto no primeiro, quanto no segundo impacto, só podem ser percebidos como produtos de uma rede social, não acessíveis ao ator individual a não ser pela rede.

Mas isso não é tudo. O advento das ferramentas de comunicação mediada pelo computador parece ter tornado as pessoas mais conscientes do ato de repassar informações. Como o feedback da rede é mais rápido, mais facilmente se tem a percepção dos impactos primários e secundários na rede. Com isso, as motivações parecem tornar-se mais apuradas.

Em outros trabalhos, eu defendi que há dois motivos principais pelos quais as pessoas replicam informações em redes sociais na Internet: O primeiro é por conta de seu valor relacional, onde o valor secundário está nos laços fortes, ou seja, nos atores que estão mais próximos de mim. Nesses casos, a mensagem tende a ser difundida entre os grupos sociais, pois parte do valor é que os demais atores participem de forma ativa, dessa difusão. Há um impacto reputacional, mas menor. É o caso, por exemplo, dos jogos, da entrada em um site de rede social, etc. O segundo motivo é informacional. Aqui, o valor está na propagação da mensagem em si e não na interação que ela proporciona. Daí, é mais relacionado ao espalhamento pelos laços fracos e o impacto secundário é diretamente relacionado à reputação. É o caso de um post no meu blog, por exemplo. Quanto mais gente sabe disso, mais interessante é pra mim.

Vou explicar isso um pouco melhor a partir de um exemplo no próximo post. :)
por raquel (19:27) [comentar este post]


Comentários

Caruso (abril 27, 2009 11:59 AM) disse:

Parece-me que a maioria das pessoas não chegam ao nível das Intenções e Motivações por trás do que repassam adiante - intencionalidade e motivação dá a impressão de que elas tem uma noção mais planejada do que selecionam para replicar - como você chegou a articular bem com a perspectiva de sua pesquisa.

O que é replicado e propagado tem muita relação também com auto-afirmação e consolidação da identidade a partir do que os interessa. A reputação e o valor informacional é uma consequência desta postura.

Caruso (abril 27, 2009 12:05 PM) disse:

Parece-me que a maioria das pessoas não chegam ao nível das Intenções e Motivações por trás do que repassam adiante - intencionalidade e motivação dá a impressão de que elas tem uma noção mais planejada do que selecionam para replicar - como você chegou a articular bem com a perspectiva de sua pesquisa.

O que é replicado e propagado tem muita relação também com auto-afirmação e consolidação da identidade a partir do que os interessa. A reputação e o valor informacional é uma consequência desta postura.

A perspectiva em relação a identidade - pessoas x instituições - quando utilizam a rede social evidencia um pouco melhor este aspecto. Instituições tentam avaliar ao máximo e enquadrar o que publicam e replicam de informação para enquadrar-se em seu modelo de comunicação. Pessoas, são mais multifacetadas - talvez os que utilizam os recursos profissionalmente tenham Intencionalidade e Motivação mais evidente.

Leandro Cianconi (abril 28, 2009 10:04 PM) disse:

Não concordo com a perspectiva dada pelo Caruso - que deduz intenção e motivação como noção e ação planejada. Se escapar para este plano irá entrar no campo da relevância da informação e da subjetividade.

Ao mesmo tempo acho muito arriscada a proposta descrita por Jenkins. Importantes teorias como a Teoria de Santiago percorrem estudos analógicos dos tecidos biológicos para os tecidos sociais com algum sucesso, apesar das óbvias diferenças entre os contextos. Ocorre que o foco é dado aos estímulos gerados pelo próprio organismo ou ator social, e também aos estímulos externos originados no ambiente.

A consciência certamente tem impacto no comportamento individual dos atores sociais ou biológicos, mas estaremos negando uma série de estudos como os propostos por Steven Johnson, se deixarmos de considerar a inteligência e consciência superior de agentes coletivos.

Comente este post